My title: "Queerer than we can suppose: the strangeness of science." "Queerer than we can suppose" comes from J.B.S. Haldane, the famous biologist, who said, "Now, my own suspicion is that the universe is not only queerer than we suppose, but queerer than we can suppose. I suspect that there are more things in heaven and earth than are dreamed of, or can be dreamed of, in any philosophy." Richard Feynman compared the accuracy of quantum theories -- experimental predictions -- to specifying the width of North America to within one hair's breadth of accuracy. This means that quantum theory has got to be, in some sense, true. Yet the assumptions that quantum theory needs to make in order to deliver those predictions are so mysterious that even Feynman himself was moved to remark, "If you think you understand quantum theory, you don't understand quantum theory."
O meu título: "Mais singular do que podemos conceber: A estranheza da Ciência." "Mais Singular do que podemos supor" é uma expressão de J.B.S. Haldane o famoso biólogo, que disse: "Suspeito que o universo não é apenas mais estranho do que supomos, mas mais singular do que podemos conceber. Suspeito que há mais coisas no Céu e na Terra do que se sonha, ou pode sonhar-se, em qualquer filosofia." Richard Feynman comparou a precisão da teoria quântica — previsões experimentais — à determinação da largura dos Estados Unidos da América com a precisão do diâmetro de um cabelo. Isso significa que a teoria quântica tem que ser, de algum modo, verdadeira. Todavia os pressupostos que a teoria quântica precisa de definir, para obter essas previsões, são tão misteriosos que até o próprio Feynman teve que fazer o seguinte comentário: "Se achas que compreendes a teoria quântica, é porque não compreendes a teoria quântica."
It's so queer that physicists resort to one or another paradoxical interpretation of it. David Deutsch, who's talking here, in "The Fabric of Reality," embraces the many-worlds interpretation of quantum theory, because the worst that you can say about it is that it's preposterously wasteful. It postulates a vast and rapidly growing number of universes existing in parallel, mutually undetectable, except through the narrow porthole of quantum mechanical experiments. And that's Richard Feynman.
É tão estranha que os físicos recorrem a esta ou aquela interpretação paradoxal dela. David Deutsch, que também fez uma palestra aqui no TED, em "A Fábrica da Realidade" adopta a "interpretação de muitos mundos" da teoria quântica, porque a pior coisa que se pode dizer sobre ela é que é disparatadamente desperdiçadora. Postula um grande número de universos que aumenta muito rapidamente existindo em paralelo — mutuamente indetectáveis, excepto através de estreitos portais de experiências de mecânica quântica. Este é Richard Feynman.
The biologist Lewis Wolpert believes that the queerness of modern physics is just an extreme example. Science, as opposed to technology, does violence to common sense. Every time you drink a glass of water, he points out, the odds are that you will imbibe at least one molecule that passed through the bladder of Oliver Cromwell. (Laughter) It's just elementary probability theory.
O biólogo Lewis Wolpert acredita que a singularidade da física moderna é apenas um exemplo extremo. A ciência, ao contrário da tecnologia violenta o senso comum. "Sempre que bebemos um copo de água", assinala, "as probabilidades mostram que bebemos pelo menos uma molécula que passou pela bexiga de Oliver Cromwell". (Risos) É apenas uma elementar teoria das probabilidades.
(Laughter)
The number of molecules per glassful is hugely greater than the number of glassfuls, or bladdersful, in the world. And of course, there's nothing special about Cromwell or bladders -- you have just breathed in a nitrogen atom that passed through the right lung of the third iguanodon to the left of the tall cycad tree.
O número de moléculas por copo cheio de água é gigantescamente maior do que o número de copos de água, ou de bexigas cheias, no mundo. Claro que Cromwell não tem nada de especial, nem as bexigas. Vocês acabaram de inspirar um átomo de azoto que passou pelo pulmão direito do terceiro iguanossauro à esquerda de uma alta cicadófita.
"Queerer than we can suppose." What is it that makes us capable of supposing anything, and does this tell us anything about what we can suppose? Are there things about the universe that will be forever beyond our grasp, but not beyond the grasp of some superior intelligence? Are there things about the universe that are, in principle, ungraspable by any mind, however superior? The history of science has been one long series of violent brainstorms, as successive generations have come to terms with increasing levels of queerness in the universe. We're now so used to the idea that the Earth spins, rather than the Sun moves across the sky, it's hard for us to realize what a shattering mental revolution that must have been. After all, it seems obvious that the Earth is large and motionless, the Sun, small and mobile. But it's worth recalling Wittgenstein's remark on the subject: "Tell me," he asked a friend, "why do people always say it was natural for man to assume that the Sun went 'round the Earth, rather than that the Earth was rotating?" And his friend replied, "Well, obviously, because it just looks as though the Sun is going round the Earth." Wittgenstein replied, "Well, what would it have looked like if it had looked as though the Earth was rotating?"
"Mais singular do que podemos conceber." O que é que nos torna capazes de supor alguma coisa? Isso diz-nos alguma coisa sobre o que podemos conceber? Há coisas sobre o universo que estarão para sempre além da nossa capacidade de compreensão, mas não além do alcance de alguma inteligência superior? Haverá coisas sobre o universo que são, em princípio, ininteligíveis por qualquer mente, por maior que seja? A história da ciência tem sido uma longa série de brainstorms violentos, à medida que gerações sucessivas têm obtido descrições cada vez mais singulares do universo. Hoje estamos tão familiarizados com a ideia de que a Terra gira em torno do seu próprio eixo — e não é o Sol que se move — que é difícil perceber quão radical deve ter sido essa revolução mental. Afinal, parece óbvio que a Terra é grande e imóvel, que o Sol é pequeno e móvel. Mas vale a pena lembrar a observação de Wittgenstein sobre o assunto. "Diga-me", perguntou a um amigo, "porque é que as pessoas dizem sempre que foi natural o homem assumir que o Sol girava em volta da Terra em vez de considerar que a Terra girava em volta do seu eixo?" O amigo respondeu: "Obviamente porque é o que parece, que o Sol circula em volta da Terra." Wittgenstein respondeu: "Bem, então o que pareceria se parecesse que era a Terra que girava?"
(Laughter)
(Risos)
Science has taught us, against all intuition, that apparently solid things, like crystals and rocks, are really almost entirely composed of empty space. And the familiar illustration is the nucleus of an atom is a fly in the middle of a sports stadium, and the next atom is in the next sports stadium. So it would seem the hardest, solidest, densest rock is really almost entirely empty space, broken only by tiny particles so widely spaced they shouldn't count. Why, then, do rocks look and feel solid and hard and impenetrable? As an evolutionary biologist, I'd say this: our brains have evolved to help us survive within the orders of magnitude, of size and speed which our bodies operate at. We never evolved to navigate in the world of atoms. If we had, our brains probably would perceive rocks as full of empty space. Rocks feel hard and impenetrable to our hands, precisely because objects like rocks and hands cannot penetrate each other. It's therefore useful for our brains to construct notions like "solidity" and "impenetrability," because such notions help us to navigate our bodies through the middle-sized world in which we have to navigate.
A ciência ensinou-nos que, contra toda intuição, coisas aparentemente sólidas, como cristais e rochas, são, na verdade, quase totalmente compostas de espaço vazio. E na imagem habitual considera-se que o núcleo de um átomo é uma mosca no meio de um estádio de futebol e o átomo vizinho está no estádio ao lado. Então parece que a rocha mais dura, mais sólida e mais densa é realmente quase inteiramente espaço vazio, quebrado apenas por partículas minúsculas tão amplamente espaçadas que nem deveriam contar. Então porque é que vemos e sentimos as rochas tão duras e impenetráveis? Enquanto biólogo evolucionista. eu diria o seguinte: O nosso cérebro desenvolveu-se para nos ajudar a sobreviver nas ordens de grandeza, de tamanho e velocidade em que o nosso corpo funciona. Nós nunca evoluímos a ponto de navegar no mundo dos átomos. Se o pudéssemos fazer, provavelmente os nossos cérebros perceberiam que as rochas são cheias de espaço vazio. Sentimos as rochas duras e impenetráveis nas nossas mãos, precisamente porque os objectos como as pedras e as mãos não podem penetrar um no outro. Portanto, isto é útil para que os nossos cérebros construam noções como "solidez" e "impenetrabilidade", porque essas noções ajudam-nos a navegar pelo mundo de tamanho médio em que temos que navegar.
Moving to the other end of the scale, our ancestors never had to navigate through the cosmos at speeds close to the speed of light. If they had, our brains would be much better at understanding Einstein. I want to give the name "Middle World" to the medium-scaled environment in which we've evolved the ability to take act -- nothing to do with "Middle Earth" -- Middle World.
Passando para o outro extremo da escala, os nossos antepassados nunca tiveram que navegar através do universo a velocidades próximas da velocidade da luz. Se o tivessem feito, a nossa mente seria muito melhor a compreender Einstein. Quero dar o nome de "Mundo Médio" ao ambiente de escala média em que desenvolvemos a capacidade de agir. Não tem nada a ver com Terra Média. Mundo do Meio.
(Laughter)
(Risos)
We are evolved denizens of Middle World, and that limits what we are capable of imagining. We find it intuitively easy to grasp ideas like, when a rabbit moves at the sort of medium velocity at which rabbits and other Middle World objects move, and hits another Middle World object like a rock, it knocks itself out.
Evoluímos como habitantes do Mundo do Meio. Isso limita o que nós somos capazes de imaginar. Instintivamente, achamos fácil compreender ideias como, quando um coelho se move, à velocidade média com que se movem coelhos e outros corpos do Mundo do Meio, e colide com outro corpo do Mundo do Meio, caia estatelado.
May I introduce Major General Albert Stubblebine III, commander of military intelligence in 1983.
Vou apresentar o general Albert Stubblebine III, comandante das informações militares em 1983.
"...[He] stared at his wall in Arlington, Virginia, and decided to do it. As frightening as the prospect was, he was going into the next office. He stood up and moved out from behind his desk. 'What is the atom mostly made of?' he thought, 'Space.' He started walking. 'What am I mostly made of? Atoms.' He quickened his pace, almost to a jog now. 'What is the wall mostly made of?'
Olhou fixamente para uma parede em Arlington, Virginia, e decidiu fazê-lo. Por mais assustador que parecesse, ia passar para o escritório do lado. Levantou-se e saiu de trás da secretária. "De que é feito, na sua maior parte, o átomo?" pensou. . Espaço. Começou a caminhar. "De que é que eu sou feito?" Átomos. Acelerou o passo, agora quase em corrida. "De que é feita a parede?"
(Laughter)
'Atoms!' All I have to do is merge the spaces. Then, General Stubblebine banged his nose hard on the wall of his office. Stubblebine, who commanded 16,000 soldiers, was confounded by his continual failure to walk through the wall. He has no doubt that this ability will one day be a common tool in the military arsenal. Who would screw around with an army that could do that?"
Átomos. "Só preciso de fundir os espaços". Então, o nariz do general Stubblebine embateu com força na parede do escritório. Stubblebine, que comandara 16 000 soldados, ficou confundido pelo seu fracasso continuado em atravessar a parede. Não tem dúvida de que um dia esta capacidade será uma ferramenta comum no arsenal militar. Quem se meteria com um exército que o conseguisse fazer?
That's from an article in Playboy, which I was reading the other day.
Retirei isto de um artigo da Playboy, que estive a ler no outro dia.
(Laughter)
(Risos)
I have every reason to think it's true; I was reading Playboy because I, myself, had an article in it.
Tenho todas as razões para pensar que é verdade. estava a ler a Playboy porque também tenho lá um artigo.
(Laughter)
(Risos)
Unaided human intuition, schooled in Middle World, finds it hard to believe Galileo when he tells us a heavy object and a light object, air friction aside, would hit the ground at the same instant. And that's because in Middle World, air friction is always there. If we'd evolved in a vacuum, we would expect them to hit the ground simultaneously. If we were bacteria, constantly buffeted by thermal movements of molecules, it would be different. But we Middle-Worlders are too big to notice Brownian motion. In the same way, our lives are dominated by gravity, but are almost oblivious to the force of surface tension. A small insect would reverse these priorities.
Apenas a intuição, aprendida no Mundo do Meio, tem dificuldade em acreditar em Galileo quando ele afirma que um corpo pesado e um corpo leve, na ausência de resistência do ar, atingem o solo no mesmo instante. Isto porque no Mundo do Meio, a resistência do ar está sempre presente. Se tivéssemos evoluído no vácuo, acharíamos normal que esses corpos atingissem o solo simultaneamente. Se fossemos bactérias permanentemente empurradas pelos movimentos térmicos das moléculas, seria diferente, mas os habitantes do Mundo do Meio são demasiado grandes para sentir o movimento Browniano. Do mesmo modo, as nossas vidas são dominadas pela gravidade mas somos quase indiferentes à força de tensão superficial. Um pequeno insecto inverteria estas prioridades.
Steve Grand -- he's the one on the left, Douglas Adams is on the right. Steve Grand, in his book, "Creation: Life and How to Make It," is positively scathing about our preoccupation with matter itself. We have this tendency to think that only solid, material things are really things at all. Waves of electromagnetic fluctuation in a vacuum seem unreal. Victorians thought the waves had to be waves in some material medium: the ether. But we find real matter comforting only because we've evolved to survive in Middle World, where matter is a useful fiction. A whirlpool, for Steve Grand, is a thing with just as much reality as a rock.
Steve Grand é o que está à esquerda. Douglas Adams está à direita. Steve Grand, no seu livro "Criação: Vida e como fazê-la", é absolutamente contundente sobre a nossa preocupação com a matéria. Temos esta tendência para pensar que só as coisas materiais, sólidas são coisas verdadeiramente reais. As ondas de flutuações electromagnéticas no vácuo parecem irreais. Os victorianos pensavam que as ondas tinham que ser ondas num certo meio material — o éter. Mas só consideramos que a matéria confortável porque evoluímos para sobreviver no Mundo do Meio em que a matéria é uma ficção útil. Um vórtice, para Steve Grand, é uma coisa tão real como uma pedra.
In a desert plain in Tanzania, in the shadow of the volcano Ol Doinyo Lengai, there's a dune made of volcanic ash. The beautiful thing is that it moves bodily. It's what's technically known as a "barchan," and the entire dune walks across the desert in a westerly direction at a speed of about 17 meters per year. It retains its crescent shape and moves in the direction of the horns. What happens is that the wind blows the sand up the shallow slope on the other side, and then, as each sand grain hits the top of the ridge, it cascades down on the inside of the crescent, and so the whole horn-shaped dune moves. Steve Grand points out that you and I are, ourselves, more like a wave than a permanent thing. He invites us, the reader, to think of an experience from your childhood, something you remember clearly, something you can see, feel, maybe even smell, as if you were really there. After all, you really were there at the time, weren't you? How else would you remember it? But here is the bombshell: You weren't there. Not a single atom that is in your body today was there when that event took place. Matter flows from place to place and momentarily comes together to be you. Whatever you are, therefore, you are not the stuff of which you are made. If that doesn't make the hair stand up on the back of your neck, read it again until it does, because it is important.
Numa planície desértica na Tanzânia, à sombra do vulcão Ol Donyo Lengai, existe uma duna feita de cinzas vulcânicas. O belo é que esta duna move-se como um todo. Isto é tecnicamente conhecido como "barchan". A duna inteira move-se através do deserto no sentido oeste com uma rapidez de cerca de 17 metros por ano. Mantém a sua forma de crescente e move-se no sentido das pontas. O que sucede é que o vento sopra a areia sobre o declive mais baixo, do lado oposto, e a seguir, consoante cada grão atinge o topo da crista da duna origina um movimento descendente de grãos no lado interior do crescente, e deste modo a duna, em forma de chifre, move-se. Steve Grand afirma que eu e vocês, todos nós, somos mais como uma onda do que como algo permanente. Convida-nos, ao leitor, para pensar numa experiência da sua infância, algo de que se lembre claramente, algo que possa ver, sentir, talvez até cheirar, como se estivesse mesmo lá. Afinal de contas, estiveram realmente lá naquela altura, não estiveram? Como podiam lembrar-se, se assim não fosse? Mas é aí que rebenta a bomba: vocês não estiveram lá. Nem um só átomo do vosso corpo actual esteve lá, quando esse acontecimento ocorreu. A matéria flui de lugar para lugar e, a certa altura, une-se para ser um de nós. Independentemente do que somos, não somos as coisas de que somos feitos. Se isto não vos faz arrepiar o cabelo, leiam-no de novo até que isso aconteça, porque isso é importante.
So "really" isn't a word that we should use with simple confidence. If a neutrino had a brain, which it evolved in neutrino-sized ancestors, it would say that rocks really do consist of empty space. We have brains that evolved in medium-sized ancestors which couldn't walk through rocks. "Really," for an animal, is whatever its brain needs it to be in order to assist its survival. And because different species live in different worlds, there will be a discomforting variety of "reallys." What we see of the real world is not the unvarnished world, but a model of the world, regulated and adjusted by sense data, but constructed so it's useful for dealing with the real world.
"Realmente" é uma palavra que não devíamos utilizar com confiança. Se um neutrino tivesse um cérebro, que tivesse evoluído em antepassados do tamanho do neutrino diriam que as rochas são formadas realmente por espaço vazio. Nós temos cérebros que evoluíram de antepassados de tamanho médio que não conseguiam atravessar as rochas. Para um animal, "realmente", é tudo o que o seu cérebro precisa que seja para o ajudar a sobreviver, Como as diferentes espécies vivem em mundos diferentes, haverá uma variedade desconcertante de "realmentes". O que vemos do mundo real não é o mundo sem verniz, mas um modelo do mundo, regulado e ajustado por dados sensoriais, mas construído para ser útil para interagir com o mundo real.
The nature of the model depends on the kind of animal we are. A flying animal needs a different kind of model from a walking, climbing or swimming animal. A monkey's brain must have software capable of simulating a three-dimensional world of branches and trunks. A mole's software for constructing models of its world will be customized for underground use. A water strider's brain doesn't need 3D software at all, since it lives on the surface of the pond, in an Edwin Abbott flatland.
A natureza do modelo depende do tipo de animal que formos. Um animal voador necessita de um modelo de tipo diferente do de um animal que anda, trepa ou nada. O cérebro de um macaco tem de ter um software capaz de simular um mundo tridimensional de galhos e troncos. O software de uma toupeira para construir modelos do seu mundo estará adaptado para uma utilização subterrânea. O cérebro de um alfaiate aquático não necessita de nenhum software 3D dado que vive na superfície de um lago, no "Flatland" de Edwin Abbott.
I've speculated that bats may see color with their ears. The world model that a bat needs in order to navigate through three dimensions catching insects must be pretty similar to the world model that any flying bird -- a day-flying bird like a swallow -- needs to perform the same kind of tasks. The fact that the bat uses echoes in pitch darkness to input the current variables to its model, while the swallow uses light, is incidental. Bats, I've even suggested, use perceived hues, such as red and blue, as labels, internal labels, for some useful aspect of echoes -- perhaps the acoustic texture of surfaces, furry or smooth and so on -- in the same way as swallows or indeed, we, use those perceived hues -- redness and blueness, etc. -- to label long and short wavelengths of light. There's nothing inherent about red that makes it long wavelength.
Tenho especulado que os morcegos podem ver cores com os ouvidos. O modelo de mundo de que um morcego necessita para navegar em três dimensões, a capturar insectos, deve ser muito semelhante ao modelo do mundo de qualquer ave voadora, dum pássaro diurno como a andorinha, que necessita de realizar o mesmo tipo de tarefas. O facto de o morcego utilizar ecos na escuridão, como os dados correntes nas variáveis do seu modelo, enquanto a andorinha usa a luz, é casual. Cheguei mesmo a sugerir que os morcegos usam matrizes de percepção, como vermelho e azul, como rótulos, rótulos internos, para alguns aspectos úteis dos ecos, talvez para a textura acústica das superfícies, peludas ou suaves, etc., do mesmo modo que as andorinhas ou, na verdade, nós, utilizamos essas matrizes de perceção — intensidade de vermelho e de azul etc. — para rotular comprimentos longos e curtos das ondas da luz. Não há nada inerente ao vermelho para que o comprimento de onda seja longo.
The point is that the nature of the model is governed by how it is to be used, rather than by the sensory modality involved. J.B.S. Haldane himself had something to say about animals whose world is dominated by smell. Dogs can distinguish two very similar fatty acids, extremely diluted: caprylic acid and caproic acid. The only difference, you see, is that one has an extra pair of carbon atoms in the chain. Haldane guesses that a dog would probably be able to place the acids in the order of their molecular weights by their smells, just as a man could place a number of piano wires in the order of their lengths by means of their notes. Now, there's another fatty acid, capric acid, which is just like the other two, except that it has two more carbon atoms. A dog that had never met capric acid would, perhaps, have no more trouble imagining its smell than we would have trouble imagining a trumpet, say, playing one note higher than we've heard a trumpet play before. Perhaps dogs and rhinos and other smell-oriented animals smell in color. And the argument would be exactly the same as for the bats.
E o fundamental é que a natureza do modelo é controlada pelo modo como é utilizado, e não pela modalidade sensorial envolvida. O próprio J. B. S. Haldane teve algo a dizer sobre os animais cujo mundo é dominado pelo cheiro. Os cães conseguem distinguir dois ácidos gordos muito semelhantes, extremamente diluídos: ácido caprílico e ácido capróico. A única diferença que se nota, é que um deles tem um par extra de átomos de carbono na cadeia. Haldane acha que provavelmente um cão é capaz de localizar os ácidos segundo a ordem das suas massas moleculares através dos seus cheiros, tal como um homem localizaria as cordas de um piano na ordem dos seus comprimentos através das suas notas musicais. Existe um outro ácido gordo, o ácido cáprico, que é muito semelhante aos outros dois, excepto no facto de conter mais dois átomos de carbono. Um cão que nunca tenha encontrado ácido cáprico, talvez não tenha maior dificuldade em conceber o seu cheiro do que nós teríamos em imaginar um trompete a tocar uma nota mais alta do que outra que já tenhamos ouvido tocar antes. Talvez os cães e os rinocerontes e outros animais orientados pelo cheiro cheirem em cores. E o argumento seria exactamente o mesmo que para os morcegos.
Middle World -- the range of sizes and speeds which we have evolved to feel intuitively comfortable with -- is a bit like the narrow range of the electromagnetic spectrum that we see as light of various colors. We're blind to all frequencies outside that, unless we use instruments to help us. Middle World is the narrow range of reality which we judge to be normal, as opposed to the queerness of the very small, the very large and the very fast. We could make a similar scale of improbabilities; nothing is totally impossible. Miracles are just events that are extremely improbable. A marble statue could wave its hand at us; the atoms that make up its crystalline structure are all vibrating back and forth anyway. Because there are so many of them, and because there's no agreement among them in their preferred direction of movement, the marble, as we see it in Middle World, stays rock steady. But the atoms in the hand could all just happen to move the same way at the same time, and again and again. In this case, the hand would move, and we'd see it waving at us in Middle World. The odds against it, of course, are so great that if you set out writing zeros at the time of the origin of the universe, you still would not have written enough zeros to this day.
O Mundo Médio — o domínio de dimensões e velocidades em que evoluímos para nos sentirmos intuitivamente confortáveis — é um pouco como a estreita faixa do espectro electromagnético que vemos como luz de cores diferentes. Somos cegos a todas as frequências fora desta faixa, a menos que usemos instrumentos que nos ajudem. O Mundo Médio é uma faixa estreita da realidade que julgamos ser normal, em oposição à estranheza do muito pequeno, do muito grande e do muito rápido. Poderíamos fazer uma escala semelhante de improbabilidades; nada é totalmente impossível. Os milagres são apenas acontecimentos extremamente improváveis. Uma estátua de mármore poderia acenar-nos. Os átomos que constituem a sua estrutura cristalina estão, aliás, a vibrar de um lado e para o outro Como são imensos, e porque não há acordo entre eles numa direcção privilegiada de movimento, o mármore, tal como o vemos no Mundo do Meio, tem o aspecto duma rocha firme. Mas os átomos da mão poderiam mover-se do mesmo modo, ao mesmo tempo, repetidas vezes. Nesse caso, veríamos a mão mover-se e a acenar, no Mundo do Meio. A probabilidade para tal, obviamente, é tão pequena que, se começássemos a escrever zeros no instante em que o universo teve origem, ainda hoje não teríamos escrito um número suficiente de zeros.
Evolution in Middle World has not equipped us to handle very improbable events; we don't live long enough. In the vastness of astronomical space and geological time, that which seems impossible in Middle World might turn out to be inevitable. One way to think about that is by counting planets. We don't know how many planets there are in the universe, but a good estimate is about 10 to the 20, or 100 billion billion. And that gives us a nice way to express our estimate of life's improbability. We could make some sort of landmark points along a spectrum of improbability, which might look like the electromagnetic spectrum we just looked at.
A evolução no Mundo do Meio não nos equipou para lidar com acontecimentos muito improváveis. A nossa vida não é suficientemente longa. Na vastidão do espaço astronómico e do tempo geológico, o que parece impossível no Mundo do Meio pode vir a ser inevitável. Um modo de pensar sobre isso é contando planetas. Não sabemos quantos planetas existem no universo, mas uma boa estimativa é entre 10 e 20, ou 100 triliões Isto dá-nos uma boa maneira de exprimir a nossa estimativa da improbabilidade da vida. Podíamos fazer algum tipo de pontos de referência ao longo de um espectro de improbabilidade, que podia parecer-se com o espectro electromagnético que acabamos de ver.
If life has arisen only once on any -- life could originate once per planet, could be extremely common or it could originate once per star or once per galaxy or maybe only once in the entire universe, in which case it would have to be here. And somewhere up there would be the chance that a frog would turn into a prince, and similar magical things like that. If life has arisen on only one planet in the entire universe, that planet has to be our planet, because here we are talking about it. And that means that if we want to avail ourselves of it, we're allowed to postulate chemical events in the origin of life which have a probability as low as one in 100 billion billion. I don't think we shall have to avail ourselves of that, because I suspect that life is quite common in the universe. And when I say quite common, it could still be so rare that no one island of life ever encounters another, which is a sad thought.
Se a vida pudesse originar-se uma vez por cada planeta podia ser extremamente comum. Se pudesse ter origem uma vez por cada estrela, ou uma vez por galáxia ou talvez apenas uma única vez em todo o universo, em cujo caso teria que ser aqui. Noutro lugar qualquer, pelo espaço, seria a probabilidade de um sapo se transformar num príncipe ou outros fenómenos mágicos desse género. Se a vida surgiu apenas num único planeta em todo o universo, esse planeta tem que ser o nosso, porque estamos aqui a falar disso. Isso significa que, se queremos tirar partido disso, podemos postular acontecimentos químicos na origem da vida que têm uma probabilidade tão pequena quanto um em 100 triliões. Penso que não devemos tirar proveito disso, porque suspeito que a vida é muito comum no universo. Quando digo muito comum, poderá ser tão rara que nenhuma ilha de vida jamais encontraria outra, o que é um pensamento triste.
How shall we interpret "queerer than we can suppose?" Queerer than can in principle be supposed, or just queerer than we can suppose, given the limitations of our brain's evolutionary apprenticeship in Middle World? Could we, by training and practice, emancipate ourselves from Middle World and achieve some sort of intuitive as well as mathematical understanding of the very small and the very large? I genuinely don't know the answer. I wonder whether we might help ourselves to understand, say, quantum theory, if we brought up children to play computer games beginning in early childhood, which had a make-believe world of balls going through two slits on a screen, a world in which the strange goings-on of quantum mechanics were enlarged by the computer's make-believe, so that they became familiar on the Middle-World scale of the stream. And similarly, a relativistic computer game, in which objects on the screen manifest the Lorentz contraction, and so on, to try to get ourselves -- to get children into the way of thinking about it.
Como deveremos interpretar "mais estranho do que concebemos?" Será mais estranho do que, em princípio, concebemos ou apenas mais estranho do que concebemos dadas as limitações dos nossos cérebros aprendizes evolutivos do Mundo Médio? Será que podíamos, através da prática e treino, emanciparmo-nos do Mundo Médio? Atingir um entendimento intuitivo e matemático, do muito pequeno e do muito grande? Sinceramente não sei a resposta. Pergunto-me se nos ajudaria a compreender a teoria quântica, por exemplo, pôr crianças a jogar jogos de computador, desde cedo na infância, que tivessem um tipo de mundo faz-de-conta de bolas que atravessassem duas fendas num ecrã, um mundo em que os estranhos caminhos da mecânica quântica fossem ampliados pelo mundo faz-de-conta do computador, para elas se familiarizarem com esta escala no Mundo-do-Meio. Do mesmo modo, um jogo de computador relativista em que os objectos do ecrã exibissem a contracção de Lorentz, etc., para tentar que o nosso pensamento seguisse esse caminho. levar as crianças a pensar nisso.
I want to end by applying the idea of Middle World to our perceptions of each other. Most scientists today subscribe to a mechanistic view of the mind: we're the way we are because our brains are wired up as they are, our hormones are the way they are. We'd be different, our characters would be different, if our neuro-anatomy and our physiological chemistry were different. But we scientists are inconsistent. If we were consistent, our response to a misbehaving person, like a child-murderer, should be something like: this unit has a faulty component; it needs repairing. That's not what we say. What we say -- and I include the most austerely mechanistic among us, which is probably me -- what we say is, "Vile monster, prison is too good for you." Or worse, we seek revenge, in all probability thereby triggering the next phase in an escalating cycle of counter-revenge, which we see, of course, all over the world today. In short, when we're thinking like academics, we regard people as elaborate and complicated machines, like computers or cars. But when we revert to being human, we behave more like Basil Fawlty, who, we remember, thrashed his car to teach it a lesson, when it wouldn't start on "Gourmet Night."
Quero terminar aplicando a ideia do Mundo do Meio à nossa percepção uns dos outros. Actualmente, a maioria dos cientistas subscreve uma visão mecanicista da mente: somos como somos porque os nossos cérebros têm a arquitectura que têm, as nossas hormonas são como são. Seríamos diferentes, as nossas características seriam diferentes, se a nossa neuro-anatomia e a nossa química fisiológica fossem diferentes. Mas nós, os cientistas, somos inconsistentes. Se fôssemos consistentes, a nossa resposta perante uma pessoa desajustada, como um assassino de crianças, seria algo como: "Esta unidade tem um componente avariado, precisa de reparação". Não é o que dizemos, o que dizemos — e incluo o mecanicista mais austero de todos que provavelmente sou eu — "Monstro vil, a prisão é boa demais para ti." Ou pior ainda, procuramos vingança, com grande probabilidade de disparar a fase seguinte dum ciclo vicioso de contra-vingança, que vemos hoje por todo o mundo. Resumidamente, quando pensamos como académicos, olhamos para as pessoas como máquinas elaboradas e complicadas, como computadores ou carros, mas quando regressamos ao lado humano comportamo-nos mais como Basil Fawlty, que rebentou com o seu carro para lhe dar uma lição quando ele não quis arrancar numa noite gastronómica.
(Laughter)
(Risos)
The reason we personify things like cars and computers is that just as monkeys live in an arboreal world and moles live in an underground world and water striders live in a surface tension-dominated flatland, we live in a social world. We swim through a sea of people -- a social version of Middle World. We are evolved to second-guess the behavior of others by becoming brilliant, intuitive psychologists. Treating people as machines may be scientifically and philosophically accurate, but it's a cumbersome waste of time if you want to guess what this person is going to do next. The economically useful way to model a person is to treat him as a purposeful, goal-seeking agent with pleasures and pains, desires and intentions, guilt, blame-worthiness. Personification and the imputing of intentional purpose is such a brilliantly successful way to model humans, it's hardly surprising the same modeling software often seizes control when we're trying to think about entities for which it's not appropriate, like Basil Fawlty with his car or like millions of deluded people, with the universe as a whole.
A razão por que personificamos as coisas como os carros e os computadores é que, tal como os macacos vivem num mundo arbóreo, as toupeiras vivem num mundo subterrâneo e os alfaiates vivem num "Flatland" dominado pela tensão superficial, nós vivemos num mundo social. Nadamos num mar de pessoas uma versão social do Mundo do Meio. Evoluímos para tentar adivinhar o comportamento dos outros transformando-nos em psicólogos intuitivos e brilhantes. Tratar as pessoas como máquinas pode ser cientificamente e filosoficamente adequado, mas é uma profunda perda de tempo se queremos adivinhar o que esta pessoa vai fazer a seguir. O modo economicamente útil de representar uma pessoa é tratá-la como um agente com finalidades, que procura atingir determinadas metas com prazeres e dores, desejos e intenções, culpa, culpabilizável. A personificação e a atribuição de uma intenção é um modo tão bem sucedido de conceber o homem, que não é surpresa nenhuma que o mesmo software de modelação com frequência assuma o controlo, quando estamos a pensar em entidades para as quais não é apropriado, como o Basil Fawlty com o seu carro ou como milhões de pessoas desiludidas com o universo como um todo.
(Laughter)
(Risos)
If the universe is queerer than we can suppose, is it just because we've been naturally selected to suppose only what we needed to suppose in order to survive in the Pleistocene of Africa? Or are our brains so versatile and expandable that we can train ourselves to break out of the box of our evolution? Or finally, are there some things in the universe so queer that no philosophy of beings, however godlike, could dream them?
Se o universo é mais estranho do que podemos conceber, será apenas porque fomos naturalmente seleccionados para conceber apenas aquilo que precisamos de conceber para poder sobreviver no Pleistoceno em África? Ou serão os nossos cérebros tão versáteis e expansíveis que poderemos treiná-los para sair da caixa da nossa evolução? Ou, finalmente, existirão no universo coisas tão singulares que nenhuma filosofia de seres, por mais divinos, pudesse sonhá-las?
Thank you very much.
Muito obrigado
(Applause)
(Aplausos)