Who am I? Who is anyone, really?
Quem sou eu? Quem é quem, na verdade?
When I wake up in the morning and open my eyes, a world appears. These days, since I've hardly been anywhere, it's a very familiar world: there's the wardrobe beyond the end of the bed, the shuttered windows and the shrieking of seagulls, which drives Brighton residents like me absolutely crazy. But even more familiar is the experience of being a self, of being me, that glides into existence at almost the same time.
Quando acordo de manhã e abro os olhos, aparece um mundo. Ultimamente, como não vou a lado nenhum, é um mundo muito conhecido: há o guarda-roupa ao fundo da cama, as janelas com os estores fechados e o som das gaivotas, que enlouquecem os moradores de Brighton, como eu. Mas ainda mais familiar é a experiência de ter um ego, de ser eu, que entra em cena quase no mesmo instante.
Now this experience of selfhood is so mundane that its appearance, usually, just happens without us noticing at all. We take our selves for granted, but we shouldn't. How things seem is not how they are. For most of us, most of the time, it seems as though the self, your self, is an enduring and unified entity -- in essence, a unique identity. Perhaps it seems as though the self is the recipient of wave upon wave of perceptions, as if the world just pours itself into the mind through the transparent windows of the senses. Perhaps it seems as though the self is the decision-maker in chief, deciding what to do next and then doing it, or, as the case may be, doing something else. We sense, we think and we act. This is how things seem.
Esta experiência de ter uma consciência própria é tão normal que acontece, muitas das vezes, sem sequer nos apercebermos. Damos isso como garantido, mas não devíamos. As coisas não são o que parecem. Para a maioria de nós, na maior parte do tempo, parece que o nosso ego é uma unidade consistente e duradoura, em essência, uma identidade própria. Talvez pareça que o ego vai recebendo perceções em vagas após vagas, como se o mundo estivesse a derramar-se para dentro da mente através das janelas transparentes dos sentidos. Talvez pareça que o ego é que está a tomar decisões, a decidir o que fazer a seguir e executá-lo, ou, como pode acontecer, fazer uma coisa diferente. Nós sentimos, pensamos e agimos. Isto é o que parece.
How things are is very different, and the story of how and why this is so is what I want to give you a flavor of today. In this story, the self is not the thing that does the perceiving. The self is a perception too, or rather, it's the collection of related perceptions. Experiences of the self and of the world turn out to be kinds of controlled hallucinations, brain-based best guesses that remain tied to the world and the body in ways determined not by their accuracy, but by their utility, by their usefulness for the organism in the business of staying alive.
Mas a verdade é muito diferente, e a história de como e porque isso acontece é um pouco o que vos quero trazer hoje. Nesta história, o ego não é aquilo que perceciona. O próprio ego também é uma perceção, ou melhor, é uma série de perceções relacionadas entre si. Experiências do eu e do mundo acabam por ser uma espécie de alucinações controladas, conjeturas do cérebro que se mantêm ligadas ao mundo e ao corpo não por serem corretas, mas por serem úteis, por nos ajudarem a mantermo-nos vivos.
Now the basic idea is quite simple, and it goes back a very long way in both science and philosophy -- all the way back, in fact, to Plato and to the shadows cast by firelight on the walls of a cave, shadows which the prisoners within took to be the real world.
A ideia básica é simples, e é muito antiga na ciência e na filosofia — tão antiga como Platão — e as sombras causadas pelo fogo nas paredes da caverna, sombras que os prisioneiros no seu interior achavam ser o mundo real.
Raw sensory signals, the electromagnetic waves that impinge upon our retinas, the pressure waves that assault our eardrums, and so on, well, they're always ambiguous and uncertain. Although they reflect really existing things in the world, they do so only indirectly. The eyes are not transparent windows from a self out onto a world, nor are the ears, nor are any of our senses. The perceptual world that arises for us in each conscious moment -- a world full of objects and people, with properties like shape, color and position -- is always and everywhere created by the brain, through a process of what we can call “inference,” of under-the-hood, neurally implemented brain-based best guessing.
A informação sensorial em estado bruto, as ondas eletromagnéticas que chegam às nossas retinas, as ondas de pressão que atacam os nossos tímpanos, e assim em diante, são sempre ambíguas e incertas. Mesmo refletindo coisas que existem mesmo no mundo, refletem-nas indiretamente. Os olhos não são janelas transparentes de um eu que olha para o mundo, nem os ouvidos, nem nenhum dos nossos sentidos. A perceção do mundo que nos chega a cada momento consciente — um mundo cheio de objetos e pessoas, com propriedades como formas, cores e posições — é sempre criado pelo cérebro, através de um processo a que chamamos “inferência”, previsões baseadas no funcionamento misterioso dos neurónios no nosso cérebro.
Now ... Here's a red coffee cup. When I see this red coffee cup, when I consciously see it, that's because "red coffee cup" is my brain's best guess of the hidden and ultimately unknowable sensory signals that reach my eyes. And just think about the redness itself, for a moment. Does the color red exist in the world? No, it doesn't. And we don't need neuroscience to tell us this. Newton discovered long ago that all the colors we experience, the rainbow of the visible spectrum, are based on just a few wavelengths of electromagnetic radiation, which itself is, of course, entirely colorless. For us humans, a whole universe of color is generated from just three of these wavelengths, corresponding to the three types of cells in our retinas. Color-wise, this thin slice of reality, this is where we live. Our experience of color -- indeed, our experience of anything -- is both less than and more than whatever the real world really is.
Agora... Isto é uma caneca vermelha. Quando tomo consciência que estou a ver uma caneca vermelha é porque “caneca vermelha” é o melhor palpite do meu cérebro, dadas as misteriosas impressões sensoriais que chegam aos meus olhos. Por um momento, pensemos apenas no facto de ser vermelha. Esta cor existe no mundo? Não, não existe. Não precisamos de neurociência para saber isto. Newton descobriu há muito tempo que as cores que vemos, o arco-íris no espetro visível, são baseadas apenas na medida da onda de frequência da radiação eletromagnética, que, em si, claro que não tem cor absolutamente nenhuma. Para nós, seres humanos, todo um universo de cores se forma a partir apenas de três destes comprimentos de onda, correspondentes a três tipos de células nas nossas retinas. Em termos de cores, nós vivemos nesta pequena fatia de realidade. A nossa perceção da cor — na verdade, a nossa perceção de qualquer coisa — é, ao mesmo tempo, menos e mais do que existe mesmo no mundo real.
Now what's happening when we experience color is that the brain is tracking an invariance, a regularity in how objects and surfaces reflect light. It's making a best guess, a top-down, inside-out prediction, about the causes of the relevant sensory signals, and the content of that prediction -- that's what we experience as red. Does this mean that red is in the brain, rather than the world? Well, no. The experience of redness requires both the world and a brain, unless you're dreaming, but let's not worry about that for now. Nothing in the brain is actually red. Cézanne, the great impressionist painter, once said that color is where the brain and the universe meet.
Então, o que acontece quando experienciamos cor é que o cérebro está a detetar padrões, uma regularidade na forma como objetos e superfícies refletem luz. Está a dar o seu melhor palpite, uma previsão baseada na informação que tem sobre o que está na origem desses sinais sensoriais relevantes, e o conteúdo dessa previsão. É o que experienciamos como a cor vermelha. Isto quer dizer que o vermelho está só no cérebro e não no mundo? Bem, não. A experiência de ver o vermelho requer ambos, o mundo e o cérebro, a não ser que estejamos a sonhar, mas isso não é para agora. Nada no cérebro é mesmo vermelho. Cézanne, o grande pintor impressionista, disse uma vez que a cor é onde o cérebro e o universo se encontram.
Now the upshot of all this is that perceptual experience is what I've come to call, drawing on the words of others, a “controlled hallucination.” Now this is a tricky term, prone to misunderstandings, so let me be clear. What I mean is that the brain is continuously generating predictions about the causes of sensory signals, whether these come from the world or from the body, and the sensory signals themselves serve as prediction errors, reporting a difference between what the brain expects and what it gets, so that the predictions can be continuously updated. Perception isn't a process of reading out sensory signals in a bottom-up or outside-in direction. It's always an active construction, an inside-out, top-down neuronal fantasy that is yoked to reality in a never-ending dance of prediction and prediction error. Now I call this process controlled hallucination to emphasize just this point. All of our experiences are active constructions arising from within, and there's a continuity here, between normal perception and what we typically call hallucination, where, for example, people might see or hear things that others don't. But in normal perception, the control is just as important as the hallucination. Our perceptual experiences are not arbitrary. The mind doesn't make up reality. While experienced colors need a mind to exist, physical things, like the coffee cup itself, exist in the world whether we're perceiving them or not -- it’s the way in which these things appear in our conscious experience that is always a construction, always a creative act of brain-based best guessing.
A conclusão disto é que a experiência da perceção é o que comecei a chamar de, usando palavras de outros, uma “alucinação controlada”. Esta expressão pode ser enganadora, por isso quero clarificar. O que quero dizer é que o cérebro está constantemente a fazer previsões sobre o que estará na origem das impressões sensoriais, quer venham do mundo exterior, quer venham do corpo, e as próprias impressões sensoriais servem para prever erros, detetar diferenças entre o que o cérebro espera e o que obtém, para que as previsões sejam continuamente atualizadas. A perceção não é uma forma de ler impressões sensoriais de baixo para cima ou de fora para dentro. É sempre uma construção ativa, uma fantasia neuronal de dentro para fora, de cima para baixo que está associada à realidade numa dança eterna entre previsões corretas e incorretas. Eu chamo a isto alucinação controlada para sublinhar este ponto. Todas as nossas experiências são construções ativas que surgem do interior, e há aqui uma ligação entre a perceção normal e o que habitualmente chamamos de alucinação, em que, por exemplo, há pessoas que veem e ouvem coisas e outras não. Mas na perceção normal, o controlo é tão importante quanto a alucinação. As nossas experiências percetivas não são arbitrárias. A mente não inventa a realidade. Enquanto as cores precisam da mente para existir, as coisas físicas, como a caneca, existem no mundo, quer tenhamos perceção delas ou não — é a forma como elas aparecem na nossa experiência consciente que é sempre uma construção, é sempre um ato criativo do cérebro a tentar adivinhar.
And because we all have different brains, we will each inhabit our own distinctive, personalized inner universe.
E como todos temos cérebros diferentes, todos habitamos o nosso universo interior distinto e personalizado.
Now I've digressed quite far from where we began, so let me end by returning to the self, to the experience of being you, or being me. They key idea here is that the experience of being a self, being any self, is also a controlled hallucination, but of a very special kind. Instead of being about the external world, experiences of selfhood are fundamentally about regulating and controlling the body. And what’s important here is that the experiences of being a self are composed of many different parts that normally hang together in a unified way, but which can come apart in, for instance, psychological or neurological disorders, There are experiences of being a continuous person over time, with a name and a set of memories shaped by our social and cultural environments. There are experiences of free will, of intending to do something, or of being the cause of things that happen. There are experiences of perceiving the world from a particular perspective, a first-person point of view. And then, there are deeply embodied experiences, for instance of identifying with an object in the world that is my body. These hands, they're my hands. And then, of emotion and mood. And at the deepest-lying, most basal levels, experiences of simply being a living body, of being alive. Now my contention is that all these aspects of being a self are all perceptual predictions of various kinds. And the most basic aspect of being any self is that part of perception which serves to regulate the interior of the body to keep you alive.
Eu divaguei para bastante longe de onde começámos, por isso vou voltar ao ego, à experiência de serem vocês, ou de ser eu. A ideia-chave aqui é que a experiência de sermos eu, de sermos qualquer ego, também é uma alucinação controlada, mas de um tipo muito especial. Em vez de lidar com o mundo exterior, as experiências do eu são fundamentalmente sobre a regulação e o controlo do corpo. E o que é importante aqui é que as experiências de ser um ego são compostas de muitas partes diferentes que normalmente funcionam como um todo, mas que podem separar-se, como nas desordens psicológicas e neurológicas. Há experiências de ser uma pessoa contínua ao longo do tempo, com um nome e uma série de memórias formadas pelo nosso ambiente social e cultural. Há experiências de livre-arbítrio, de querer fazer algo, ou ser a causa de certas coisas acontecerem. Há experiências de percecionar o mundo de uma perspetiva particular, um ponto de vista em primeira mão. Além disso, há experiências profundamente baseadas no físico, por exemplo, identificar-se com um objeto no mundo que é o meu corpo. Estas mãos são as minhas mãos. E também, emoções e estados de espírito. E nos níveis basais mais profundos, a experiência de simplesmente ser um corpo vivo, de estar vivo. O meu argumento é que todos estes aspetos de ser um ego são perceções conjeturadas de vários tipos. E o aspeto mais básico de ser um ego é essa parte da perceção que regula o interior do corpo para nos manter vivos.
And when you pull on this thread, many things follow. Everything that arises in consciousness is a perceptual prediction, and all of our conscious experiences, whether of the self or of the world, are all deeply rooted in our nature, as living machines. We experience the world around us and ourselves within it, with, through and because of our living bodies.
Começa aqui, mas liga-se a muitas outras coisas. Tudo o que surge na nossa consciência é uma conjetura da nossa perceção, e todas as nossas experiências conscientes, sejam do eu ou do mundo, são baseadas na nossa natureza de máquinas vivas. Experienciamos o mundo à nossa volta e nós dentro dele, com os nossos corpos vivos, através deles e por causa deles.
So who are you, really? Think of yourself as being like the color red. You exist, but you might not be what you think you are.
Então, quem são vocês, realmente? Pensem em vocês como sendo como a cor vermelha. Existem, mas podem não ser aquilo que pensam que são.
Thank you.
Obrigado.
David Biello: A stand-in for the audience. Anil Seth: David is clapping.
David Biello: Eu substituo o público.
(Laughter)
Anil Seth: O David está a bater palmas.
AS: That makes me feel better. DB: It was great. Thank you for that.
AS: Isso faz-me sentir melhor.
DB: Foi fantástico. Obrigado.
I have to say that the thought of my brain floating around in a bony prison is a disturbing one. But how do all those billions and trillions of neurons give rise to this experience of consciousness, in your view?
Devo dizer que pensar que o meu cérebro está a flutuar numa prisão feita de ossos é um pouco alarmante. Mas como é que todos esses milhares de milhões e biliões de neurónios dão origem a esta experiência de consciência, na sua perspetiva?
AS: First, I mean, consciousness is experience, so I'd use the two terms synonymously there. It's the same thing. And by the way, the idea of your brain wobbling around in its bony vault of a skull is presumably less disturbing than it doing something else and doing something outside of the skull. (Laughter) That would be the more worrying situation. But the question, of course, this is the big question. You start off with a simple question, "How does it all happen?" And this is why there is a long way to go here.
AS: Primeiro, a consciência é experiência, por isso usaria os dois termos como sinónimos, neste caso. É a mesma coisa. Além disso, a ideia do cérebro andar a flutuar dentro de um crânio é supostamente menos alarmante do que estar a fazer outra coisa ou fazer algo fora do crânio. Isso seria mais preocupante. Mas essa pergunta, claro, é a grande questão. Começamos com uma pergunta simples: “Como é que tudo isto acontece?” E é por isso que ainda temos um longo caminho a percorrer.
And there are, I think, two ways to approach this mystery. So the fundamental question here is ... What is it about a physical mechanism, in this case, a neurobiological mechanism, 86 billion neurons and trillions of connections, that can generate any conscious experience? Put that way, it seems extremely hard, because conscious experiences seem to be the kinds of things that cannot be explained in terms of mechanisms, however complicated those mechanisms might be. This is the intuition that David Chalmers famously called "the hard problem." But my approach, as hinted at in this talk, is that we can characterize different properties of consciousness -- what a perceptual experience is like, what an experience of self is like, what the difference between sleep and wakefulness is like. And in each of those cases, we can tell a story about how neural mechanisms explain those properties.
E acho que há duas formas de abordar este mistério. A questão fundamental aqui é... O que é que neste mecanismo físico, neste caso, um mecanismo neurobiológico — 86 mil milhões de neurónios e biliões de conexões — que consegue gerar esta experiência consciente? Visto desta forma, parece muito complicado, porque as experiências conscientes parecem ser o tipo de coisa que não podem ser explicados em termos de mecanismos, por mais complicados que possam ser. Esta é a intuição que David Chalmers notoriamente chamou de “problema difícil”. A minha abordagem, que aflorei nesta palestra, é que podemos caracterizar diferentes propriedades da consciência — o que é uma perceção do mundo exterior, o que é uma perceção do interior, qual é a diferença entre dormir e estar acordado. Em cada um destes casos, podemos descrever como os mecanismos neuronais explicam cada uma destas propriedades.
In the part of the story we've touched on today, it's all about predictive processing, so the idea is that the brain really does encode within it a sort of predictive generative model of the causes of signals from the world, and it's the content of those predictions that constitutes our perceptual experience. And as we sort of develop and test explanations like this, the intuition is that this hard problem of how and why neurons, or whatever it is, in the brain, can generate a conscious experience, won't be solved directly -- it will be dissolved. It will gradually fade away and eventually vanish in a puff of metaphysical smoke.
No que falámos hoje, o principal é o processamento preditivo, é a ideia de que o cérebro codifica um modelo que gera certas previsões das causas das perceções do mundo, e são essas previsões que constituem a nossa experiência percetual. À medida que desenvolvemos e testamos explicações como esta, a intuição é que este problema difícil de como e porquê os neurónios, ou o que seja, no cérebro, conseguem gerar uma experiência de consciência, não será resolvido diretamente, será dissolvido. Irá dissolver-se pouco a pouco e por fim desaparecerá num sopro de fumo metafísico.
DB: Katarina wants to talk about anesthesia, that experience of having your consciousness kind of turned off. What do we know about this ability to switch a person off, in a matter of seconds? What is actually happening there, do you think?
DB: A Katarina quer falar sobre anestesia, a experiência de ter a consciência um pouco desligada. O que sabemos sobre esta capacidade de desligar uma pessoa numa questão de segundos? O que acha que está a acontecer aqui?
AS: Firstly, I think it's one of the best inventions of humanity, ever. The ability to turn people into objects and then back again into people -- I wouldn't want to live at a time in history without it. Whenever we have this, like, "Wouldn't it be nice to live in Greek antiquity or something, when people swum around, philosophizing, drinking wine?" Yes, but what about anesthesia? (Laughs) That's my response. It does work, this is a fantastic thing. How? Here's an enormous opportunity for consciousness science, because we know what anesthetics do at a very local level. We know how they act on different molecules and receptors in the brain. And of course, we know what ultimately happens, which is that people get knocked out. And by the way, it's not like going to sleep. Under general anesthesia, you're really not there. It's an oblivion comparable with the oblivion before birth or after death. So the real question is, "What is happening?" How is the local action of anesthetics affect global brain dynamics so as to explain this disappearance of consciousness? And to cut a long story very short, what seems to be happening is that the different parts of the brain become functionally disconnected from each other, and by that I mean, they speak to each other less. The brain is still active, but communication between brain areas becomes disrupted in specific ways. and there’s still a lot we need to learn about the precise ways in which this disconnection happens -- what are the signatures of the loss of consciousness? There are many different kinds of anesthetic, but whichever variety of anesthetic you take, when it works, this is what you see.
AS: Primeiro, acho que é uma das melhores invenções humanas de sempre. A capacidade de tornar as pessoas objetos e depois novamente pessoas não quereria viver numa altura da História sem isso. Quando pensamos coisas como, “Não seria bom viver na Grécia Antiga ou algo assim, “quando as pessoas andavam só a filosofar e a beber vinho?” Sim, mas e a anestesia? É essa a minha resposta. Resulta, é uma coisa fantástica. Como? Temos aqui uma ótima oportunidade de estudo da consciência, pois sabemos o que os anestésicos fazem a nível local. Sabemos como funcionam em diferentes moléculas e recetores no cérebro. E claro, sabemos o que acontece no fim, ou seja, que as pessoas perdem os sentidos. E não é o mesmo que dormir. Sob anestesia geral, não estamos mesmo lá. É um nada comparável a antes de nascer ou depois de morrer. A verdadeira questão aqui é: “O que está a acontecer?” Como é que a ação local da anestesia afeta a dinâmica global do cérebro de modo a explicar esse desaparecimento de consciência? Para resumir muito, o que parece estar a acontecer é que diferentes partes do cérebro continuam a funcionar em separado, quero dizer que falam menos entre si. O cérebro ainda está ativo, mas a comunicação entre as diferentes áreas quebra-se de formas específicas. Ainda há muito a aprender sobre estas formas específicas em que esta desconexão acontece quais são as marcas da perda de consciência? Há muitos tipos de anestésicos, mas qualquer que seja a variedade que se toma, quando resulta, é isto que se vê.
DB: I think some folks such as Jasmine and more anonymous folks are troubled by this idea that what I call red might be a different color for you and for everyone else. Is there a way of knowing if we're all hallucinating reality in a similar way or not?
DB: Penso que algumas pessoas como a Jasmine e outras ficaram perturbadas por esta ideia de que aquilo a que chamamos vermelho pode ser uma cor diferente para nós e para os outros. Há alguma forma de saber se estamos a alucinar a realidade da mesma forma ou não?
AS: Again, this is a lovely topic, and it really gets to the heart of how I've been thinking about perception, because one of the aspects of perception that I think is easy to overlook is that the contents of perception seem real, right? The redness of this coffee cup, it seems to be a mind-independent, really existing property of the external world. Now, certain aspects of this coffee cup are mind-independent. Its solidity is mind-independent. If I throw it at you, David, across the Atlantic, and you don't see it coming, it will hit you in the head, it will hurt. That doesn't depend on you seeing it, but the redness does depend on a mind. And to the extent that things depend on a mind, they're going to be different for each of us. Now, they may not be that different. In philosophy, there's this argument of the inverted spectrum, so if I see red, is that the same as you seeing green or blue, let's say? And we might never know. I don't have that much truck with that particular thought experiment. Like many thought experiments, it pushes things a little bit too far. I think the reality is that we see things like colors, maybe we see them similar, but not exactly the same, and we probably overestimate the degree of similarity between our perceptual worlds, because they're all filtered through language. I mean, I just used the word “red,” and there are many shades of red; painters would say, "What red?" I remember when I was decorating my house, it's like, "I want to paint the walls white." How many shades of white are there? This is too many. And they have weird names, which doesn't help. We will overestimate the similarity of our universe. And I think it's a really interesting question, how much they do indeed diverge.
AS: Mais uma vez, este é um ótimo ponto e vai ao centro da minha visão sobre perceção, porque um dos aspetos da perceção que penso que será fácil de deixar passar é que as nossas perceções parecem reais, certo? O vermelho da caneca parece ser independente da mente, uma propriedade que existe fora no mundo real. Certos aspetos desta caneca são independentes da mente. A sua solidez é independente da mente. Se eu a atirar para si, David, e atravessar o Atlântico, e não estiver à espera, vai bater-lhe na cabeça e vai doer. Isso não depende de como vemos, mas o vermelho depende da mente. E na medida em que as coisas dependem da mente elas vão ser diferentes para cada um de nós. Podem não ser muito diferentes. Na filosofia, há o argumento do espectro invertido, que é, se eu vejo vermelho, os outros veem verde ou azul? Talvez nunca saberemos. Eu não tenho particularmente muitas bases nessas considerações. Como em muitos exercícios intelectuais, leva as coisas um pouco longe. Eu penso que o que acontece na realidade quando vemos coisas como cores, é que as vemos parecidas, mas não exatamente iguais, e provavelmente sobrestimamos o grau de semelhança entre os nossos mundos de perceção, porque são filtrados pela linguagem. Isto é, eu usei a palavra “vermelho” e há muitos tons de vermelho; os pintores diriam: “Que vermelho?” Lembro-me de quando estava a decorar a minha casa, e “Quero pintar as paredes de branco.” Quantos tons de branco existem? Demasiados. E têm nomes esquisitos, o que não ajuda. Vamos sobrestimar a semelhança do nosso universo próprio. E penso que é uma questão muito interessante quanto é que eles realmente divergem.
You will probably remember this famous dress, this photo of a dress half the world saw as blue and black, and the other half saw as white and gold.
Provavelmente, lembram-se daquele vestido famoso, aquela foto de um vestido que metade do mundo via como azul e preto, e a outra metade via branco e dourado.
AS: You're a white and gold person? DB: Yeah, yeah.
AS: Você é dos que viam branco e dourado? DB: Sim, sim.
AS: I'm a blue and black person. I was right, the real dress is actually blue and black. (Laughter)
AS: Eu sou do azul e preto. Eu tinha razão, o vestido verdadeiro é, na verdade, azul e preto. AS: Adiante...
AS: Never mind ...
DB: We could argue about that.
DB: Podíamos discutir isso.
AS: We couldn't. It really is blue and black. I talked to the dress designer. The actual one is blue and black. There's no argument there. But the thing that made that so weird is that it's not that we vaguely see it as one color or the other, we really see that blueness and blackness or whiteness and goldness as really existing in the world. And that was an interesting lever into a recognition of how different our perceptual universes might be. And in fact, a study we're doing at Sussex over the next year or two, we're trying to characterize the amount of perceptual diversity that is just there to be discovered. We're usually only aware of it at the extremes, people call things like neurodiversity, where people have experiences that are so different, they manifest in different behaviors. But I think there's this, sort of, big dark matter of individual diversity in perception that we know very little about, but it's there.
AS: Não podíamos. É mesmo azul e preto. Eu falei com o estilista. O verdadeiro é azul e preto. Aqui não há discussão. Mas o que foi tão estranho é que não vemos levemente uma cor ou outra, vemos mesmo aquele azul e preto ou aquele branco e dourado como se existissem no mundo. E isso foi uma forma interessante de reconhecermos quão diferentes podem ser os nossos universos de perceção. Na verdade, vamos fazer um estudo em Sussex dentro de um a dois anos, para tentar caracterizar o grau de diversidade percetual que está ali para ser descoberto. Geralmente, só vemos os extremos, o que se chama de neurodiversidade, em que pessoas têm experiências tão diferentes, que se comportam de formas diferentes. Mas acho que há esta espécie de grande matéria escura de diversidade individual na perceção, de que sabemos muito pouco, mas que está lá.
DB: I'm glad we could put to rest a major internet debate and come down firmly on the blue and black side of things. Daniella wants to know, "Could you explain how memory is involved in this perception of a self?"
DB: Estou contente de termos resolvido um grande debate na Internet e chegado ao lado azul e preto das coisas. A Daniella quer saber “Pode explicar como a memória está envolvida na perceção do ego?”
AS: Just as there are many different aspects of selfhood, there are many different kinds of memory, too. I think colloquially, in everyday language, when we talk about memory, we often talk about autobiographical memory or episodic memory, like "What did I have for breakfast?" "When did I last go for a walk?" These kinds of things. "When did I last have the pleasure of talking to David?" These are the memories of things that pertain to me as a continuous individual over time. That's one way in which memory plays into self, and that part of memory can go away, and self remains -- back to the earlier point. There's a famous case I talk about in the book, of a guy called Clive Wearing, who had a brain disease, an encephalopathy, which basically obliterated his ability to lay down new autobiographical memories. He lost his hippocampus, which is a brain region very important for this function. His wife described it as him living in a permanent present tense, of between seven to 30 seconds. And then, everything was new. It's very, very difficult to put yourself in the shoes of somebody like that. But other aspects of his self remained.
AS: Tal como há diferentes aspetos do eu, também há diferentes tipos de memória. Eu penso que em todas as línguas, quando falamos coloquialmente de memória, falamos frequentemente de memórias autobiográficas ou episódicas, como: “O que comi ao pequeno-almoço?” “Qual foi a última vez que dei um passeio?” Este tipo de coisas. “Quando foi a última vez que tive o prazer de falar com o David?” Este tipo de memórias estão relacionados comigo como um indivíduo contínuo ao longo do tempo. Esta é uma das formas em que a memória influencia o sentido de eu e isso pode desaparecer e o eu ficar — voltamos ao ponto inicial. Há um caso famoso de que falo no meu livro de um homem chamado Clive Wearing, que tinha uma doença cerebral, uma encefalopatia, que, basicamente, o impedia de criar novas memórias autobiográficas. Ele perdeu o seu hipocampo, que é uma zona do cérebro muito importante para esta função. A mulher dele descreveu-o como vivendo permanentemente no momento presente de entre sete a trinta segundos. E logo tudo se renovava. É muito, muito difícil colocarmo-nos na pele de alguém assim. Mas os outros aspetos do seu ego mantiveram-se.
But then, there are all sorts of other aspects of memory that probably also play into what it is to be you or to be me. We have semantic memory. We just know things, like we know what the capital of France is, who the president is, I hope so, I don't know. Sometimes, that's a good thing. Sometimes, that's not a good thing. And all of these things that get encoded in memory shape our self too. And then finally, there's perceptual memory. It's not that experience is like a video recording that we can replay, but everything we experience changes the way we perceive things in the future, and the way we perceive things is also, in my view, part of what it is to be a self.
Mas depois, há uma série de outros aspetos da memória que provavelmente também interagem no que significa seres tu ou ser eu. Temos uma memória semântica. Apenas sabemos coisas, como sabemos a capital de França ou quem é o presidente, esperemos, não sei. Por vezes, é uma coisa boa. Por vezes, não é uma coisa tão boa. Todas estas coisas que são codificadas na nossa memória também modelam o nosso sentido de nós mesmos. Finalmente, temos a memória percetiva. Não é que a experiência seja como uma gravação que podemos voltar a ver, mas tudo o que experienciamos muda como percecionamos as coisas no futuro e como percecionamos as coisas, no meu ponto de vista, também faz parte do que constitui o nosso eu.
Actually, I just want to say, one of the really interesting questions here, and one of the things we're working on -- Imagine a typical day. You go through your typical day, you're experiencing a continuous stream of inputs. Now you blink, of course, and so on, but more or less, there's this continuous stream of inputs. Yet when we remember a day, it's usually in chunks, these autobiographical chunks: "I did this, I did that, I did the other, this happened." So a really important question is, "How does this chunking process happen?" "How does the brain extract meaningful episodes from a relatively continuous flow of data?" And it's kind of disturbing, how little of any given day we remember. So it's a very selective process, and that's something that I think is going to be useful not only for basic neuroscience, but, for instance, in helping people with memory loss and impairments, because you could, for instance, have a camera, and then, you could predict what aspects of their day would constitute a memory, and that can be very, very useful for them and for their carers.
Na verdade, quero só dizer que uma das questões realmente interessantes aqui, e uma das coisas em que estamos a trabalhar... Imaginem um dia típico. Vivem o seu dia normal, vão tendo uma linha contínua de estímulos. Pestanejam, claro, mas, no geral, há um contínuo de informações a entrar. Mas quando nos lembramos desse dia, é geralmente em bocados, em pedaços autobiográficos: “Eu fiz isto, fiz aquilo, fiz aqueloutro, isto aconteceu.” Então, uma questão muito importante é: “Como acontece este processamento em partes?” “Como é que o cérebro extrai episódios significativos “de um fluxo contínuo de informações?” E é um pouco preocupante lembrarmo-nos tão pouco de cada dia. É um processo muito seletivo, e é algo que acho que será muito útil não só para as bases da neurociência, mas, por exemplo, para ajudar pessoas com perda ou danos de memória, porque podíamos, por exemplo, ter uma câmara, e conseguir prever quais as partes do dia que iriam constituir uma memória, e isso pode ser muito útil para as pessoas e para quem cuida delas.
DB: The brain clearly has a good editor. You call us, people, "feeling machines" in your book. Care to expand on that?
DB: O cérebro, claramente, tem um bom editor. No seu livro, chama as pessoas de “máquinas de sentir”. Podia explicar isso melhor?
AS: Yeah, that's right. Well, we're not cognitive computers, we are feeling machines. And I think this is true at the level of making decisions, but for me, it's really at the heart of how to understand life, mind and consciousness. And this, really, is the idea that -- In consciousness science, we tended to think things like vision -- Vision as being the royal road to understanding consciousness. Vision is easy to study, and we're very visual creatures. But fundamentally, brains evolved and develop and operate from moment to moment to keep the body alive, always in light of this deep physiological imperative to help the organism persist in remaining an organism, in remaining alive. And that fundamental role of brains, that's what, in my view, gave rise to any kind of perception. In order to regulate something, you need to be able to predict what happens to it. It's this whole apparatus of prediction and prediction error that undergirds all of our perceptual experiences, including the self, has its origin in this role that's tightly coupled to the physiology of the body. And that's why, I think, we're feeling machines, we're not just computers that happen to be implemented on meat machines.
AS: Sim, certo. Bem, não somos computadores cognitivos, somos máquinas de sentir. E penso que isto é verdadeiro ao nível de tomar decisões, mas para mim, está mesmo na base de compreender a vida, a mente e a consciência. E esta é a ideia de que — na ciência da consciência, tendemos a considerar a visão — a visão é o caminho real para perceber a consciência. A visão é fácil de estudar, e nós somos criaturas muito visuais. Mas, fundamentalmente, os cérebros evoluíram, desenvolveram-se e funcionam de momento a momento para manter o corpo vivo, sempre sob este profundo imperativo fisiológico de ajudar o organismo a continuar a ser um organismo, a manter-se vivo. E esse papel fundamental do cérebro é o que, na minha opinião, deu origem a qualquer dos tipos de perceção. Para conseguir regular alguma coisa, é preciso conseguir prever o que lhe acontece. É todo este aparelho de previsão e erro de previsão que está subjacente à nossa experiência de perceção, incluindo o ego, tem origem neste papel muito ligado à fisiologia do corpo. E penso que é por isso que somos máquinas de sentir, não somos apenas computadores que estão inseridos em máquinas feitas de carne.
DB: Thank you, Anil, for chatting with us today.
DB: Obrigado, Anil, por falar connosco hoje.
AS: Really enjoyed it.
AS: Eu gostei muito.
AS: Thanks a lot, David. DB: Thank you.
- Muito obrigado, David. - Obrigado.